Sistema Processual Penal brasileiro de acordo com a Constituição

O artigo, 129, I, da Constituição Federal de 1988, diz:

“São funções institucionais do Ministério Público: i – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”.

Este dispositivo consagra o princípio da inércia, também chamado em latim de ne procedat iudex ex officio. Esse princípio significa que o processo judicial não pode ser deflagrado de ofício. A função jurisdicional só poderá ocorrer, se houver provocação do órgão de acusação. Desta forma, o sistema processual penal brasileiro, de acordo com a Constituição Federal de 1988, é o sistema acusatório.

Sistema Processual Penal brasileiro de acordo com a Constituição

 

A Constituição estabeleceu o sistema acusatório no momento em que entregou ao Ministério Público a privatividade da ação penal pública. Por essa razão, também é possível denominarmos o princípio da inércia de princípio acusatório. Ainda diz o supracitado artigo que a ação penal pública é privativa do Ministério Público. E se ação penal pública é privativa do Ministério, isso quer dizer que está vedada a atuação de ofício por parte dos juízes

Antigamente, no processo penal brasileiro, os juízes iniciavam o processo de ofício. Contudo, com o advento da Constituição Federal de 1988, isso não foi mais possível. Por essa razão, dizemos que o nosso sistema processual penal vigente é o sistema acusatório. E nesse sistema inclui o princípio da inércia para garantir a imparcialidade do julgador.

Cuidado na hora de fazer a prova da OAB

Para aqueles que ainda vão fazer a prova da OAB, sugiro que fiquem atentos a esse tema envolvendo o sistema acusatório e o princípio da inércia. O examinador poderá abordar o confronto entre os diversos sistemas processuais penais existentes e as características de cada um deles.

Logo, o candidato de direito que estiver por fazer a prova da OAB tem que tomar cuidado para não cair em pegadinhas. Uma delas é a que trata sobre qual é o sistema processual penal vigente. Você tem que saber que, no direito processual penal brasileiro, o sistema vigente é o sistema acusatório. Muitas das vezes a aprovação não acontece por detalhes. E é por isso que costumo também indicar as pegadinhas na minha obra sobre Exame da OAB Simplificado. Assim evita que mesmo tenha o domínio sobre o assunto você erre a questão.

Sistema Acusatório Privado

Antes do homem utilizar a escrita em sociedade, o que nós tínhamos era um sistema acusatório privado. Nessa situação, o processo era uma coisa de partes e por isso bastante complicado. Primeiro porque para que existisse o processo, era preciso que o órgão julgador fosse provocado pela vítima, mas nem sempre a vítima buscava a punição do infrator.

Por outro lado, a sociedade era de castas sociais muito definidas. Na maioria das vezes a vítima pertencia a uma classe privilegiada, enquanto o réu pertencia a uma classe desprivilegiada. Isso gerava uma desigualdade de partes. E por isso existia impunidade e tráfico de influência, pois o mesmo indivíduo que era a vítima era quem indicava o órgão julgador que julgava sem fundamentar a decisão. Julgava com íntima convicção.

Caso, você tenha interesse de visualizar melhor como era esse sistema acusatório da antiguidade e goste de cinema, uma excelente dica que temos para você é para que assista o filme Mad Max e a cúpula do trovão (com Mel Gibson e Tina Turner), conforme trailer original abaixo:

Sistema Inquisitivo ou Sistema Inquisitório

Diferentemente do sistema acusatório privado, com a evolução para a idade média, surge o sistema inquisitivo ou sistema inquisitório. Nesse momento surge a ideia de que todo e qualquer crime deverá ser punido e que o direito de punir não é da vítima. O direito de punir é exclusivo do Estado, aquele Estado Absoluto.

Assim, o Estado toma para si o direito de punir e toma também para si a concentração da atuação no processo e aí existe um órgão julgador que faz todas as funções processuais. Caso também tenha interesse de saber como funcionava o sistema inquisitivo/inquisitório, sugerimos dessa vez que assista o filme “O nome da Rosa”, com Sean Connery, conforme trailer original abaixo:

No sistema inquisitório, quando o crime era praticado o inquisidor, que era o órgão julgador, deflagrava o processo. O próprio juiz (que era o inquisidor) iniciava o processo e, portanto, colhia as provas de acusação. O réu era tido como um mero objeto de investigação, subjugado ao poder do estado e exatamente por isso, o réu era destituído de direitos. O réu não tinha direito à ampla defesa e nem ao contraditório. Ele não era considerado parte, ele era um objeto de investigação do Estado (inquisidor).

Caso eventualmente existissem provas em favor do réu, estas provas também deveriam ser colhidas pelo próprio Estado. Em um primeiro momento isso surge com a intenção de melhorar a situação do réu, mas acaba evoluindo. O órgão julgador colhia as provas de acusação, de defesa e no final proferia a decisão. Portanto, as três funções processuais estavam concentradas nas mãos do mesmo órgão (que era o órgão julgador).

Características do processo inquisitivo/inquisitório

O problema era que o órgão julgador acabava sendo nitidamente parcial e a tendência era de que ele se confundisse com o órgão de acusação. As características do processo inquisitivo/inquisitório eram, portanto:

  • Linear porque o juiz concentrava as 3 funções processuais;
  • O réu era mero objeto de investigação (não existia contraditório e nem ampla defesa).

 

O grande problema era a concentração de poder nas mãos de um só. O órgão julgador era órgão de acusação, defensor e julgador. E além disso, como o processo era todo escrito, somente uma parcela da sociedade naquela época (Igreja e o Clero) conhecia e dominava a escrita.

Deste modo, o clero (conjunto de sacerdotes) assumiu a figura do órgão julgador, a figura da inquisição. E esse processo era todo necessariamente escrito e sigiloso. É certo que o sigilo do sistema inquisitivo/inquisitório surge no primeiro momento para garantir que o réu, caso viesse a ser absolvido, não fosse prejudicado pelo processo.

O problema é que o mesmo sigilo que surge como uma garantia na evolução do sistema inquisitivo/inquisitório acaba dando margem ao que aconteceu na inquisição. Toda vez um novo sistema surge, ele tenta resolver o problema do sistema anterior e o grande inconveniente no sistema antigo era o fato de que os juízes não precisavam explicar por que estavam decidindo.

Criação do instituto da Prova tarifada e Prova Legal

Para resolver o problema dessa falta de justificativa nas decisões de juízes que foi criado o instituto da prova legal e prova tarifada, pois tinham um valor probante. Ou seja, criou-se um sistema no qual a lei estabelecia que prova podia ser utilizada e qual o valor daquela prova para fins de julgamento. E a decisão a ser proferida pelo juiz resultava quase de um cálculo matemático entre os valores dados às provas. Desta forma, o juiz não podia mais julgar de acordo com o seu convencimento.

Acontece que existia uma prova que tinha um valor maior que todas as outras que era o caso da confissão. Isso fez com que fosse possível que existisse em um processo 99% das provas o inocentando, mas se ele confessasse, ele era condenado. Não à toa a confissão era chamada de rainha das provas. E um grande problema também desse sistema consistia no fato de que a confissão ainda podia ser obtida por qualquer meio.

E foi justamente mediante essa questão de prova tarifada e legal que resultou naquilo que deu margem para a inquisição aplicar os chamados juízos de Deus. A lei dizia: bota na fogueira, se queimar é culpado, se não queimar não é culpado. Fura o olho se ficar cego foi ele, se não ficar é porque não foi. Joga na água com uma pedra amarrada, se afundar foi ele e se não afundar não foi. Assim, aplicava-se o juízo de Deus, também conhecido como ordálias.

Criação do Sistema Acusatório

Depois dessa época, surgiu o iluminismo e com ele veio o sistema acusatório, bem como Rousseau, Montesquieu e a ideia de tripartição de funções do Estado. Essa ideia era de que as três funções processuais devem ser devolvidas a entes distintos na relação jurídica processual. Então, o órgão julgador não poderia mais atuar como órgão de acusação, mas ao mesmo tempo a acusação tinha que ser concentrada nas mãos do Estado. Isso não podia ser devolvido para a vítima, salvo em casos excepcionais.

Daí surgiu na França a figura do Ministério Público que é o Estado acusador. Aí ele oferece a denúncia provocando o julgador (Juiz) que chama o réu para integrar a relação jurídica em um processo triangular.

Características do Processo Acusatório

Deste modo, as características de um processo acusatório são:

  • Processo triangular;
  • Processo de partes e o órgão julgador é inerte para garantir a imparcialidade;
  • Existe igualdade entre as partes;
  • Existe ampla defesa e contraditório (o réu volta a ser titular de direitos);
  • Processo público (para garantir a fiscalização da sociedade sobre as decisões judiciais e atos do processo);
  • Oralidade que traz também a concentração (quanto mais oral um procedimento, mais concentrado ele será).

 

No entanto, não era possível continuar com a ideia de prova tarifada e legal. Era preciso devolver ao sistema a liberdade dos meios de prova. Assim, voltou-se com a liberdade probatória com algumas exceções como a prova ilícita, por exemplo. Os juízes não julgavam mais com valores matemáticos e sim com o seu convencimento, desde que fundamentassem a sua decisão.

Deste modo, o juiz passou a ter o livre convencimento motivado ou persuasão racional. E essas são as características de um processo acusatório.

Sistema Processual Penal Brasileiro

Não há dúvidas de que o sistema processual penal brasileiro é acusatório. Entretanto, o nosso sistema processual penal tem vestígios inquisitivos/inquisitórios. Por conta desses vestígios inquisitivos/inquisitórios, alguns autores falam que o nosso sistema é acusatório misto. Em um sistema acusatório de verdade, o juiz é inerte também durante o processo e não pode produzir prova. Porém no nosso processo penal brasileiro, em nome da verdade real, os juízes têm poderes instrutórios.

O problema de usar a expressão “acusatório misto” é que pode confundir com o sistema acusatório de outros países. No brasil, o sistema acusatório não é puro porque existem vestígios inquisitivos/inquisitórios.

No entanto, existem países como Argentina, por exemplo, que adotam um sistema “acusatório misto” diferente que é um processo que tem duas fases processuais: inquisitiva (onde o juiz colhe provas sem ampla defesa e sem o contraditório e entrega as provas pro Ministério Público) e acusatória.

Já no Brasil não temos essas duas fases processuais, há somente uma. Importante frisar que o inquérito não é processo. O inquérito é fase pré-processual de natureza administrativa e ele não integra o processo. É possível até mesmo ter uma denúncia sem o inquérito.

Conclusão sobre o sistema processual penal brasileiro

Portanto, podemos concluir que o sistema processual penal brasileiro é acusatório, mas não é um acusatório puro porque tem vestígios inquisitivos/inquisitórios. Entretanto, mesmo não sendo puro, o ideal para quem for fazer a prova da oab, é dizer que o sistema processual penal brasileiro é acusatório.

Você tem mais dúvidas sobre processo penal ou outras matérias do Direito? Deixe o seu comentário sobre quais assuntos gostaria que abordássemos no próximo post, além das críticas, sugestões e opiniões.

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